Este Blogue destina-se a fornecer e partillhar informação disponível sobre o Donjuanismo na literatura, servindo assim de complemento e aprefeiçoamento ao trabalho iniciado e publicado neste ensaio.

domingo, 14 de março de 2010




Este trabalho de investigação científica, concebido e realizado por Manuela Sobrinho para obtenção do grau de mestre em Estudos Portugueses Interdisciplinares na Universidade Aberta, incide sobre o donjuanismo, um dos mais importantes mitos da literatura europeia.
O assunto era arriscado à partida: o Dicionário de Don Juan de Brunel possui 1025 páginas e uma busca simples usando um motor da rede devolve cerca de 14 900 resultados.
Por outro lado, o tema foi introduzido tardiamente na literatura portuguesa e são quase inexistentes os estudos que têm por objecto a literatura mais recente pelo que este livro vem preencher uma lacuna que se impunha colmatar no estudo da literatura portuguesa.
Com consciência dos inúmeros perigos da tarefa, Manuela Sobrinho levou a cabo um difícil e exigente trabalho de análise e reflexão de natureza interdisciplinar. O fulcro da sua tese, exemplarmente escrita, é a análise do estereótipo ou cliché no discurso amoroso e o desvendamento de um núcleo de referências relacionado com os preconceitos culturais. Para isso analisa a doxa, tanto nas formas e estruturas verbais como nos conceitos ou esquemas cognitivos, ou ainda nos factos sócio-históricos inseparáveis do contexto que os viu nascer. Deste modo se constitui como um trabalho verdadeiramente pioneiro nos estudos do donjuanismo ao permitir identificar um discurso argumentativo (logos), melhor apresentar a figura (ethos) de Don Juan que pretende seduzir apelando às emoções e paixões (pathos) de uma multiplicidade de mulheres.
Estas linhas orientadoras, redutíveis no fundamental à retórica e comunicação, encontram-se também nas obras escolhidas para análise: textos dramáticos produzidos em Portugal desde o poema dramático datado de 1874, A Morte de D. João de Guerra Junqueiro, até ao recente libreto de José Saramago, Don Giovanni ou o Dissoluto absolvido, a partir da qual o italiano Azio Gorghi compôs uma ópera que teve estreia absoluta no teatro de S. Carlos em 18 de Março de
2006.
Duas das grandes virtudes deste estudo são, por um lado, a identificação das flutuações e permanências de códigos amorosos ao longo deste espaço temporal, assim revelando traços comuns de um fenómeno complexo, simultaneamente familiar e mal conhecido, e, por outro, convocar várias abordagens, sociológica, filosófica, estilística, psicológica e literária que interessam à filosofia da linguagem, à linguística, à crítica literária em geral e à sociocrítica em particular.
A justeza da leitura das obras mais recentes da literatura portuguesa surge depois de dois capítulos em que a Autora trata do donjuanismo, um mito literário particularmente persistente, e do estereótipo ou cliché, uma noção problemática que exige não só a
análise das formas como também a consideração do seu valor estético ou da sua função.
É uma escrita do prazer e de prazer na desconstrução dos códigos retóricos da paixão amorosa e da sedução e nessa medida também é uma leitura de prazer para qualquer leitor.
Rosa Maria Sequeira (Prefácio da obra)
Quem não conhece Don Juan, ou o seu mito. Para os homens ele aparece como aquele que granjeia enorme popularidade entre mulheres, fá-las suspirar só de ouvir o seu nome, trazendo com isso intimidades sonhadas. As mulheres, por seu lado, olham para Don Juan como aquele que lhes dá carinho, que lhes fala ao ouvido palavras ternas, que as ama e as mima, mesmo que por pouco tempo, mesmo sabendo que o têm de repartir com outras, já que o estado de alma cavalheiresco e jovial não permite ser homem de uma só mulher, mesmo que elas queiram acreditar em tal. Para descobrirmos este mito, o do homem cavalheiresco e, ao mesmo tempo, mulherengo, dedicou alguns anos da sua vida Maria Manuela Sobrinho, que culminou com um interessante trabalho que deu origem à sua tese de mestrado com o título O estereótipo no donjuanismo, sendo agora editado pela Fonte da Palavra como Dom Juan e o Donjuanismo, onde a autora se debruça sobre o estereótipo da personagem, mas estende esse estudo à literatura donjuanina em Portugal. Para isso debruçou-se sobre as obras mais representativas de autores vários como Guerra Junqueiro, António Patrício, Norberto Ávila ou José Saramago. Os resultados acabam por surpreender. Não foi a literatura que criou o mito de Don Juan, foi ele que se apropriou da literatura. É o mito da palavra, que segundo Maria Manuela Sobrinho não é identificável com o mito literário.

Alfredo Vieira (http://www.ionline.pt/conteudo/48816-dom-juan-e-o-donjuanismo)